ARTUR QUARESMA FILHO
Contaminação de solos: "empresa e academia devem atuar juntas"

A experiência acumulada na gestão do Sinduscon-SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo) e na diretoria nacional da ABMS permitiu ao engenheiro civil Artur Quaresma Filho consolidar algumas convicções. Ele acredita, por exemplo, que empresa e academia devem atuar juntas para benefício da sociedade. "O fundamental é que a iniciativa privada e o meio acadêmico compartilhem os mesmos objetivos e os meios para atingi-los". Os resultados dessa cooperação "podem ser fantásticos". Um dos focos desta atuação pode ser, segundo Quaresma, a identificação e o tratamento de solos contaminados, questões cuja importância o Brasil só agora começa a considerar.

A realização de qualquer negócio imobiliário depende hoje da identificação das condições ambientais da área. Quando duas empresas negociam um determinado terreno, "a presença ou não de problemas nessa área já interfere no próprio valor do negócio", explica Artur Quaresma Filho.

Meio ambiente é, portanto, um tema que veio para ficar - e não só no ramo imobiliário. É assunto do dia-a-dia, que envolve não só incorporadoras e construtoras, mas também indústrias, empresas de serviços e companhias de todos os portes e segmentos. As justificativas e alegações politicamente corretas têm, sem dúvida, a sua importância. Mas o que mais conta é a mão pesada da lei. Assim como é importante evitar a ocorrência de passivos trabalhistas, é também indispensável para as empresas identificar eventuais passivos ambientais.

BOOM IMOBILIÁRIO E MEIO AMBIENTE

Graças às mudanças na ocupação industrial das regiões metropolitanas e à expansão imobiliária que ganhou força especialmente a partir de 2006, Quaresma vive hoje a rara experiência de administrar excesso de demanda e negociar prazos para realizar seus projetos. Experiente em "administrar crises", ele acredita que a boa fase aparentemente não tem prazo certo para acabar.

As causas desse otimismo? "O Brasil tem um enorme déficit habitacional e agora há financiamento para suprir essa carência". Estima-se em 12 milhões o número de famílias que moram de aluguel. E o mercado bancário financia hoje cerca de 600 mil unidades por ano.

O financiamento direto dos bancos às construtoras vem crescendo exponencialmente. Os recursos destinados em 2007 para essas empresas foram de R$ 10 bilhões - o dobro do valor de 2006 e o triplo de 2005. O boom imobiliário está refletido também nos números da mão-de-obra. A construção civil contratou 91 mil trabalhadores em 2007 - mais do dobro de 2006. Hoje trabalham no setor 177 mil pessoas. As vendas de cimento cresceram 10% em 2007, atingindo 45,8 milhões de toneladas. A estimativa do setor é encerrar 2008 com vendas de 50 milhões de toneladas.

E o que o boom imobiliário tem a ver com a questão da contaminação de solos? Quaresma explica que as incorporadoras e construtoras estão atentas à questão ambiental. "Não se faz um empreendimento de vulto sem antes identificar os potenciais de risco da área". A presença de contaminação não significa que o empreendimento será abandonado. Há várias soluções técnicas para viabilizar o negócio. Dentre as várias soluções disponíveis, é possível, por exemplo, tratar a água, isolar a área, recolher e incinerar parte do terreno, ou tratar o solo com microorganismos. "O que não se pode é ignorar o problema, sob pena de se criar um passivo ambiental de proporções desconhecidas".

A identificação de um número de crescente de áreas contaminadas decorre de três fatores principais. O primeiro fator é estrutural, inerente ao próprio desenvolvimento industrial, que gera de forma contínua situações de risco ao meio ambiente. O segundo fator está na criação de leis ambientais rígidas e complexas, aliada à atuação mais firme das autoridades. O terceiro fator, de caráter mais conjuntural, está nas mudanças na ocupação industrial, principalmente nos grandes centros do país. Estimuladas por incentivos fiscais e pelo baixo preço dos terrenos em regiões mais distantes, as indústrias vêm se mudando, das regiões metropolitanas para terrenos mais afastados. O resultado, muitas vezes, é um passivo de contaminação deixado nas áreas antes ocupadas.

FUSÕES E AQUISIÇÕES

"Antes de concretizar uma fusão ou a compra de outra indústria, as empresas procuram identificar a eventual presença de contaminação nas áreas onde estão instaladas", explica Quaresma. E mesmo quando não há negócios em vista, as grandes empresas, em especial as multinacionais, procuram evitar a criação de passivos ambientais, fazendo por conta própria um levantamento das áreas onde estão instaladas. Quando a contaminação é identificada, não é o fim do mundo. "Nos países desenvolvidos, a remediação de terrenos e a descontaminação de áreas é uma atividade como qualquer outra", aponta Quaresma.

A Engesolos dispõe de equipe técnica e equipamentos para coletar amostras e identificar a presença de contaminação da área. A empresa entra em cena garantindo que as amostras atendam as especificações técnicas do cliente, a quem cabe remetê-las para um laboratório especializado. "Não fazemos consultoria na área ambiental, nem ensaiamos as amostras. Atuamos como a ferramenta para a consultoria coletar corretamente as amostras e, posteriormente, como veículo para eventual remediação", explica Quaresma.


SÃO PAULO: MAIS DE DUAS MIL ÁREAS CONTAMINADAS

No Brasil, a situação já começa a mudar. Até maio de 2002, no Estado de São Paulo, havia só 255 áreas identificadas. Os dados oficiais mais recentes acusam 2.272 áreas contaminadas por "substâncias ou resíduos depositados, acumulados, armazenados, enterrados ou infiltrados de forma planejada, acidental ou até mesmo natural", segundo definição da Cetesb (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental do Estado de São Paulo), responsável pelo levantamento. E este número não pára de crescer. Clique aqui para obter cópia do relatório da Cetesb.

Das 2.272 áreas identificadas, 94 já passaram por processo de remediação. Outras 884 estão com os seus processos de remediação em andamento. No mundo desenvolvido, o patamar é quase mil vezes maior. Desde 1984, das 440 mil áreas contaminadas nos EUA, 303 mil sofreram processos de remediação. Há naquele país programas federais e estaduais para identificação e remediação de áreas contaminadas, considerando o grau de risco à saúde e ao meio ambiente.

No Brasil, a identificação de solos contaminados teve grande impulso com a Resolução n° 273/2000, do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), que exigiu, entre outras providências, o licenciamento ambiental de postos revendedores de combustíveis. O que estava recoberto pela terra começou a vir à tona. Instalações antigas e tanques deteriorados levaram à contaminação de milhares de áreas de postos de combustíveis - ao todo, são cerca de 35 mil existentes no país. só no Estado de São Paulo, a Cetesb cita 1.745 postos localizados em áreas contaminadas. Não há estatísticas confiáveis para o conjunto do país.

União entre empresa e academia

Artur Quaresma Filho dedica hoje a totalidade do seu tempo à Engesolos, empresa paulista dedicada à realização de ensaios geotécnicos de campo e de laboratório. A dedicação à empresa não o afasta completamente das atividades associativas. "Estou pronto a colaborar com a sociedade, em especial com entidades como a ABMS, sempre puder contribuir de alguma forma". Porém, quando o assunto é participar das entidades diretamente é taxativo: "sinto o dever cumprido depois de participar 16 anos diretamente na gestão de entidades compartilhando o tempo com a ENGESOLOS. Agora é hora de focar somente a empresa, o futuro dela e dos demais negócios que vêem sendo estudados".

Sua experiência no meio acadêmico e no setor privado permitiu que ele consolidasse algumas convicções. Quaresma acredita, por exemplo, que empresa e academia podem produzir juntas inúmeros benefícios à sociedade. "O fundamental é que ambas possam compartilhar objetivos e buscar meios para atingi-los". Os resultados "podem ser fantásticos".

Um dos focos para esta atuação conjunta pode ser justamente a identificação e a remediação de áreas contaminadas. "Há uma legislação muito complexa, vários órgãos com atuação às vezes sobreposta, e diversos pontos que merecem aperfeiçoamento". Quaresma cita, por exemplo, a questão dos aterros necessários para o descarte de materiais oriundos de áreas contaminadas. "Ninguém quer abrigar um aterro nas suas proximidades ou no seu município". Ele acha possível avançar também na implantação de mecanismos mais ágeis e eficazes para a recuperação de áreas contaminadas, fazendo disso uma atividade próspera, com benefícios para toda a sociedade.